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Questões Jurídicas sobre a nova geração

PlayStation 4 - Console - PS4
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Xbox One - Brasil Game Show 2013

Salve, salve leitores do Select Game, depois de mais de ano, volto a postar algo por aqui.
Nova geração chegando, sempre com preços elevados, e que trouxe com ela algumas questões jurídicas, irei abordar duas delas. A primeira, mais simples, referente a entrega errada de produtos e a segunda, mais intrincada, referente a garantia de produtos adquiridas no exterior frente a empresa nacional. Bem delimitados os temas, vamos lá.
1. COMPREI MEU CONSOLE NO BRASIL E ME ENTREGARAM O PRODUTO ERRADO.
Muitas pessoas hoje em dia fazem  suas compras pela internet, principalmente de produtos em pré-venda, no Brasil, infelizmente, não há a cultura de lojas físicas reservarem produtos, assim quem quer garantir o objeto de desejo antes do lançamento acaba recorrendo a sites de e-comerce.
Essa semana veio a tona o caso da Youtuber Nady Games, que diz ter feito sua pré-order no ShopTime.com e acabou recebendo uma caixa com 6 copos, publicando um vídeo sobre o assunto e que acabou tendo repercussão nacional nos veículos digitais. Acompanhando os posts sobre o assunto, constatei que muitas pessoas ficaram indignadas com a situação da moça e acabaram por extrapolar a situação, falando inclusive de processos por danos morais, o que já adianto que não é o caso, vamos por partes.
Qualquer empresa grande de e-commerce pratica milhares de transações por dia e é possível que seu sistema de logística cometa algum erro, assim ocorre um problema na entrega do produto. Diante do ocorrido o consumidor tem de contatar a loja para que a mesma resolva o equívoco que de alguma forma foi cometido. A loja, por sua vez, tem até 30 dias para resolver todo e qualquer problema referente a essa compra, o que está incluso eventuais vícios (problemas) que o produto que a ele será entregue possa conter, portanto são 30 dias para entregar o produto comprado e em perfeito funcionamento.
Citando o caso concreto narrado acima, a consumidora tem que contatar a loja mencionada e exigir que o produto correto lhe seja entregue em perfeito funcionamento. Não tem ela direito a cobrar danos morais, pois danos morais só são devidos frente a desrespeito a direitos da personalidade, quando ocorre malefícios a dignidade da pessoa humana, o que não é o caso, isso nada mais é que o dissabor do dia a dia, até previsível de acontecer em qualquer e-commerce.
Aprofundando um pouco mais o caso concreto, o console que a Youtuber deve receber é uma edição limitada intitulada Day One (uma edição apenas para aqueles que compraram o console antes do seu lançamento), é essa edição que a mesma tem o direito de receber. Aí vem a pergunta: mas e se o comerciante não tiver mais essa edição, nesse caso ela tem direito a indenização por dano morais?
A resposta é negativa, como já explicado, nenhum direito da personalidade da consumidora foi violado, o que a consumidora pode ter tido foi um prejuízo material, que pode ser resolvido da seguinte forma:
1. Receber a versão “normal” do console e pleitear um abatimento no preço, visto que o produto é diverso do comprado, o que o torna um pouco inferior, mas que no caso concreto é difícil mensurar essa redução, pois o console que não é Day One é R$ 100,00 mais caro que o Day One (visto que o Day One era vendido por R$ 2.199,00 e o normal é vendido agora por R$ 2.299,00), todavia vejo como juridicamente possível tal pleito, pois com certeza consoles Day One já devem estar sendo vendidos como itens de colecionador a um preço superior a esse.
2. Rescindir o contrato de compra do aparelho, recebendo a restituição pelo que pagou.
Tão somente essas duas possibilidades e somente depois dos 30 dias citados acima.
Bom, superado o assunto que virou manchete essa semana, vamos ao assunto mais intrincado.
2. GARANTIA DE PRODUTOS COMPRADOS NO EXTERIOR E EXIGIDAS NO BRASIL.
Muitas pessoas compram produtos no exterior em uma viagem própria ou pede pra algum conhecido/parente comprar pra ele em sua viagem ao exterior, mas ao chegar ao Brasil a pessoa se depara com um produto contendo um vício, com isso a pessoa se desespera, pois comprou o mesmo “lá fora”. Assim surge a questão, pode a pessoa de exigir a garantia frente a empresa nacional que vende aqui o mesmo produto? É do que vamos tratar doravante.

PlayStation 4 - Brasil Game Show 2013

Insta esclarecer que o assunto é complexo e nem um pouco pacífico no nosso Judiciário, mas isso é uma boa notícia ao consumidor, pois se não é pacífico, é porque há decisões nos dois sentidos, uma dizendo que o consumidor não tem esse direito e outras dizem que sim, que a empresa é responsável. No nosso caso imaginemos que alguém vá para os Estados Unidos e compre um PS4 que não envia sinais de video pelo HDMI ou um Xbox One que o drive óptico não esteja funcionando, ambos problemas que aconteceram com alguns consumidores dos consoles. Pode a pessoa ao chegar no Brasil ir até uma assistência técnica da SonyBR ou MicrosoftBR e exigir que se cumpra a garantia que foi dada pela SonyUSA ou MicrosftUSA? Começamos pelos argumentos das empresas alegam.
O principal argumento das empresas nacionais é que elas não venderam o produto, não foram elas que colocaram o produto viciado no mercado, que as empresas só podem ser responsáveis por produtos que elas mesmas forneceram, como as empresas BR tem personalidade jurídica própria, não podem ser responsabilizados por atos de outras empresas, pra simplificar, seria o mesmo que o consumidor cobrar você por uma coisa que seu irmão fez.
Aprofundando um pouco mais sobre o assunto, sei que aqui é um site sobre games e não um site jurídico, mas acredito que possa ser interessante pra quem quer entender um pouco melhor o assunto. A responsabilidade civil de empresas assim, coligadas, é sempre subsidiária uma em relação a outra. Melhor explicando, a Sony BR é uma subsidiária de alguma Sony pelo mundo (desculpem-me a falta de precisão nesse momento), o mesmo ocorre com a Microsoft BR, assim se uma pessoa tiver um problema grande com uma empresa multinacional e ao processar a sua filial brasileira, sendo o seu patrimônio insuficiente para ressarcir esse consumidor, pode ele “atacar” o patrimônio das demais empresas filiadas e da matriz. O x da questão está justamente na subsidiariedade traçada na frase anterior, pois a empresa estrangeira só virá a responder pelo ato da brasileira se esta tiver patrimônio insuficiente, isso é a responsabilidade subsidiária. É claro que no mundo jurídico isso exigiria uma série de explicações, uma série de requisitos, mas que aqui não cabe consignar. O mesmo se aplica as empresas situadas em outros países, a empresa brasileira só poderia ser chamada a ser responsável, isso se aplica a garantia, se a empresa estrangeira não tivesse patrimônio o bastante para pelo ato responder.
Portanto o consumidor que comprou um produto no estrangeiro e vem aqui exigir a garantia, estaria passando por cima da responsabilidade do fornecedor do país de origem, não estaria respeitando essa ordem de responsabilidades, teria o consumidor que primeiramente responsabilizar a empresa estrangeira para só depois conseguir responsabilizar a empresa BR.
O que foi retratado em uma matéria do G1, a qual recomendo a leitura neste link http://g1.globo.com/tecnologia/games/noticia/2013/11/videogame-de-nova-geracao-importado-nao-tem-garantia-no-brasil.html que trouxe os argumentos das multinacionais Sony e Microsoft.
Bom já explorado o ponto de vista das empresas, vamos ao que interessa, demonstrar que é possível sim exigir a garantia das empresas BR por uma compra feita no exterior, vejamos.
Como já dito, os argumentos das empresas BR era por sua irresponsabilidade no caso em tela e assim decidiam os nossos tribunais, até que em um caso a situação se inverteu, o Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o Recurso Especial 63981/SP, no dia 04 de abril de 2000, determinou que a Panasonic BR era responsável pela garantia ofertada em uma compra realizada no exterior, sob o argumento que com a atual economia globalizada não encontra mais fronteiras, principalmente para a responsabilização em casos assim, vejamos os argumentos utilizados pelos Ministros que transcrevo abaixo:

DIREITO DO CONSUMIDOR. FILMADORA ADQUIRIDA NO EXTERIOR. DEFEITO DA MERCADORIA. RESPONSABILIDADE DA EMPRESA NACIONAL DA MESMA MARCA (“PANASONIC”). ECONOMIA GLOBALIZADA. PROPAGANDA. PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR. PECULIARIDADES DA ESPÉCIE. SITUAÇÕES A PONDERAR NOS CASOS CONCRETOS. NULIDADE DO ACÓRDÃO ESTADUAL REJEITADA, PORQUE SUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO NO MÉRITO, POR MAIORIA.

I – Se a economia globalizada não mais tem fronteiras rígidas e estimula e favorece a livre concorrência, imprescindível que as leis de proteção ao consumidor ganhem maior expressão em sua exegese, na busca do equilíbrio que deve reger as relações jurídicas, dimensionando-se, inclusive, o fator risco, inerente à competitividade do comércio e dos negócios mercantis, sobretudo quando em escala internacional, em que presentes empresas poderosas, multinacionais, com filiais em vários países, sem falar nas vendas hoje efetuadas pelo processo tecnológico da informática e no forte mercado consumidor que representa o nosso País.

II – O mercado consumidor, não há como negar, vê-se hoje “bombardeado” diuturnamente por intensa e hábil propaganda, a induzir a aquisição de produtos, notadamente os sofisticados de procedência estrangeira, levando em linha de conta diversos fatores, dentre os quais, e com  relevo, a respeitabilidade da marca.

III- Se empresas nacionais se beneficiam de marcas mundialmente conhecidas, incumbe-lhes responder também pelas deficiências dos produtos que anunciam e comercializam, não sendo razoável destinar-se ao consumidor as conseqüências negativas dos negócios envolvendo objetos defeituosos.

IV – Impõe-se, no entanto, nos casos concretos, ponderar as situações existentes.

V – Rejeita-se a nulidade argüida quando sem lastro na lei ou nos autos.

 Vejam que o acórdão (nome técnico da decisão) é claro, a empresa nacional é responsável, mas em cada caso tem de haver ponderação diante do caso concreto para não haver excessos, mas a empresa foi responsabilizada a fornecer a garantia ao consumidor, com base nesse precedente diversas outras decisões no mesmo sentido vem sendo proferida pelo nosso Judiciário. Cito a título de exemplo a 20100111538295ACJ julgada em 2011 por uma Turma Recursal do Distrito Federal que obrigou a empresa brasileira a cumprir a garantia ofertada pela empresa estrangeira com argumentos muito semelhantes ao da decisão acima transcrita, no caso o consumidor comprou um notebook no exterior que apresentou vícios 1 mês após o uso, notícia sobre a decisão no link (http://www.tjdft.jus.br/institucional/jurisprudencia/informativos/2011/informativo-de-jurisprudencia-no-211/produto-adquirido-no-exterior-aplicabilidade-do-cdc).
Como se vê o assunto está longe de estar pacífico, mas é possível conseguir responsabilizar as empresas nacionais por uma compra feita no exterior e assim exercer o direito de garantia sobre o produto viciado, mas trata-se de um longo caminho em nossos tribunais e que pode não ser vitorioso, mas o que até há pouco tempo era tido como impossível, hoje torna-se uma possibilidade.
Obs. Esse texto trata-se de algo voltado ao público gamer, foi redigido despreocupado de utilização de linguagem jurídica para a melhor compreensão do leitor alvo, que na sua grande maioria não tem contato com o mundo jurídico.

3 comentários em “Questões Jurídicas sobre a nova geração”

  1. Ursinhomalvado

    Bem vindo de volta!
    Pergunto o seguinte: para requerer esta garantia, tendo comprado no exterior, não se faz necessário ter um documento que comprove a entrada do produto no país? Isto afeta de algum modo as chances de se ganhar a causa?
    Refiro-me ao fato de que teremos uma nota fiscal (ou equivalente) da compra no exterior, mas não serve de prova de que o produto não seja fruto de “descaminho” ou coisa do gênero. Não se faz necessário a declaração do bem à receita na chegada ao Brasil para que emitam um documento comprovando a entrada legal, mesmo considerando que o PS4 pode ser trazido sem pagar imposto já que está dentro da cota (desde que a pessoa não traga outras coisas que ultrapassem a cogta de USD 500,00).
    Aproveito pra te perguntar se você sabe algo sobre trazer um relógio, um celular e uma máquina fotográfica fora da cota. Muito se fala disso, mas ainda não achei nenhum documento no site da Receita que comprove a veracidade. Parece mais um “a gente deixa, a não ser que estejamos de mau humor”.

    1. Alexandre Soares

      O fato do produto passar ou não pela alfândega não traz consequências práticas alguma frente ao fornecedor, o que o consumidor pode ter é implicações frente a receita federal e a polícia por ter entrado com o produto no país sem ter declarado.
      O que o consumidor vai precisar é de uma nota fiscal com a data da compra, pois toda garantia tem um limite, para produtos duráveis normalmente as fabricantes dão 1 ano de garantia contratual, a garantia legal é de 90 dias.
      Todavia isso não se aplica a vícios redibitórios (defeitos ocultos), como é o caso o 3rl e Ylod que atormentaram o consumidor na geração passada, nesses casos a garantia começa a correr a partir do problema, portanto a pessoa que comprou o X-360 lá em 2005 e agora ele deu 3RL tem direito ao reparo do aparelho, pois é um problema congênito.
      Qto ao limite eu não sou especialista na área e o meu conhecimento sobre o assunto é tão somente o de turista/consumidor, nunca estudei sobre isso, portanto qualquer afirmação minha nesse caso seria leviano de minha parte.

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